domingo, 3 de junho de 2018

O uso da radiação na conservação de alimentos


Autor: Engenheiro de Alimentos, Ademar Lopes.

A radiação, é um processo físico, na conservação de alimentos, sendo de origem recente, e possui adeptos por ser um processo rápido que não deixa resíduos e por quase não elevar a temperatura interna do produto. No entanto apesar de ser aprovado o seu uso em mais de quarenta países, ainda há aspectos controversos que inibem a sua aceitação geral e o público consumidor sempre percebe o assunto radiação com receio.
Fonte: FAO

Após a Segunda Guerra Mundial, na década de 1950, as pesquisas sobre irradiação de alimentos foram intensificadas nos EUA. Em 1963, o governo norte-americano (FDA) aprovou a irradiação de trigo, farinha de trigo e toucinho. Em 1964, estendeu o uso em batata e cebola, para evitar a germinação. Durante os anos 80 a 90, vários países regulamentaram o uso de alimentos irradiados, inclusive o Brasil.

Radiações

·        Definições

ü Radiação é qualquer dos processos físicos de emissão e propagação de energia, seja por intermédio de fenômenos ondulatórios, seja por meio de partículas doadoras de energia cinética.
ü Radiação é a energia que se propaga de um ponto a outro no espaço ou num meio material.

A radiação eletromagnética, descoberta em 1888 por Heinrich R. Hertz, compreende um amplo espectro de freqüências, tais como: ondas de radio, as microondas, radiações infravermelhas, a luz visível, a ultravioleta, os raios X e os raios gama. Essas formas de energia diferem no comprimento de onda, freqüência, força de penetração e outros efeitos que podem exercer sobre os sistemas biológicos.
A ação da radiação sobre organismos vivos pode ter efeitos benéficos ou nocivos, dependendo da sua natureza ou intensidade. Por exemplo, a luz UV induz a conversão de ergosterol em vitamina D, fator essêncial para o deposito de cálcio nos ossos em crescimento. A exposição prolongada ou repetida de UV pode levar ao desenvolvimento de câncer de pele. De maneira geral, pode-se afirmar que no espectro existem dois tipos de radiações: a calórica e a ionizante. As radiações de baixa freqüência como as ondas elétricas, sonoras, ondas de radio e infravermelho, baseiam-se no movimento eletrônico e molecular para originar calor, sendo essa a calórica.

Radiações Ionizantes

         As radiações ionizantes são radiações de alta freqüência, capazes de quebrar ligações químicas quando absorvidas pelos alimentos, podendo ocasionar a formação de íons, daí, serem chamadas ionizantes. Os produtos da ionização podem ser eletricamente carregados (íons) ou neutros (radicais livres). Essas reações causam alterações no material irradiado, conhecidas como radiólise. São essas reações que causam a destruição de microorganismos, insetos e parasitas durante a irradiação de alimentos. Elas são escolhidas pela intensidade de penetração e impossibilidade de produzir radioatividade nos alimentos tratados.
          Entre as radiações ionizantes estão incluídas as radiações alfa, beta e gama, raio X e ultravioleta. As radiações desejáveis são aquelas que possuem bom poder de penetração de modo que possam atuar sobre os microorganismos e enzimas, não só na superfície, mas também no interior do alimento.
         A unidade de radiação mais usada hoje em dia é o Gray (Gy), definido como a absorção de um Joule de energia por quilograma de alimento irradiado. O Gray equivale a 100 rads, na pratica usa-se kGy.

Legislação e Segurança de Uso.

         O ministério da Saúde publicou sobre alimentos irradiados o Decreto nº 72.718, de 29 de agosto de 1973, a Lei nº 7.394 de 29 de outubro de 1985 e a Resolução RDC nº 21, de 26 de janeiro de 2001.

A RDC nº 21 define:

·        As fontes de radiação são aquelas autorizadas pela Comissão Nacional de Energia Nuclear, a saber:
1.     Isótopos radioativos emissores de radiação gama: cobalto -60 e césio -137;
2.     Raios X gerados por maquinas que trabalham com energias de ate 5 Mev; e
3.     Elétrons gerados por maquinas que trabalham com energias de ate 10 Mev.
·         Na rotulagem dos alimentos irradiados o painel principal deve conter a frase “ alimento tratado por processo de irradiação”, com determinado tamanho de letras.
·        A mesma informação deve estar nos locais de exposição à venda de produtos irradiados, a granel.

A segurança de uso dos alimentos irradiados tem sido discutidas, e entidades reconhecidas internacionalmente, como CAC(codex alimentarius commission, 1983), FDA(Food na Drug Administration, USA, 1986) e entres outros, tem afirmado que alimentos irradiados, abaixo de 10 kGy são seguros.

Radiações Ionizantes na conservação de alimentos

         Na irradiação de alimentos deseja-se utilizar radiações que tenham boa penetração e possam atingir todos os pontos no interior do produto a ser irradiado. Por outro lado, não se deseja utilizar radiações com alta energia, como os nêutrons, pois adicionalmente, poderiam tornar o alimento radioativo. Das radiações ionizantes, somente os raios gama e as partículas beta apresentam interesse na conservação de alimentos.
         Os raios gama são obtidos de equipamentos que possuem uma fonte de isótopo de alta energia, a partir do cobalto-60 ou césio -137. Como a fonte de isótopo esta continuamente irradiando e não pode ser desligada, ela é mantida blindada em um tanque de água, localizada abaixo da área de processo. Quando em funcionamento, a fonte é elevada e o alimento embalado é carregado em esteiras transportadoras automáticas que o levam através do campo de irradiação em uma rota circular. Garantindo assim a uniformidade da dose. Ver figura abaixo.
        
Fonte: Fellows, 2006.

A dose de irradiação a ser aplicada depende da resistência dos microorganismos e enzimas, do tipo de alimento e do objetivo a ser alcançado. O DL50(dose de radiação que destrói 50% da população) do homem é de aproximadamente 5 Gy (500 rads). Os tipos de processos de irradiação podem ser divididos pelo objetivo do tratamento e dose utilizada em:

  1. Radapertização: processo que equivale à esterilização térmica obtendo produtos comercialmente estéreis que podem ser estocados em temperatura ambiente. Uma dose de 48 kGy é necessária para se obter uma redução de 12 D de Clostridium botulinum, porém ocasiona mudanças sensoriais muito fortes, na carne por exemplo, o que torna o processo com pouco interesse comercial.
  2.  Radiciação: equivalente a pasteurização, empregando doses de 2,5 a 10 kGy, suficientes para reduzir o número de microorganismos viáveis, eliminando patógenos não formadores de esporos, como Salmonella spp.
  3.  Radurização: processo similar à pasteurização, mas com doses relativamente baixas (1 a 2,5 kGy) para destruição de leveduras, bolores de bactérias não esporulantes, aumentando a vida útil do alimento irradiado. É muitas vezes empregada em associação com outros processos de conservação, como a refrigeração.
  4.  Controle de amadurecimento: alguns tipos de frutas e hortaliças (morango, tomate) podem ser irradiadas para prolongar a sua vida útil ou de prateleira em duas a três vezes. Cogumelos, quando irradiados com doses de 2 a 3 kGy, podem dobrar a sua vida útil.
  5. Desinfestação: doses baixas, inferiores a 1 kGy, são eficazes contra insetos e larvas infestando grãos e frutas.
  6. Inibição de brotamento: tem sido utilizada comercialmente em batata, cebola e alho com doses baixas (150 Gy).


Efeitos das radiações sobre microorganismos, enzimas e valor nutricional/sensorial.

         Os íons reativos produzidos pela irradiação de alimentos danificam ou destroem os microorganismos imediatamente, alterando a estrutura da membrana celular e afetando a atividade de enzimas metabólicas. Todavia, o efeito mais importante é no DNA e nas moléculas do RNA no núcleo das células, necessárias para o crescimento e replicação. Os efeitos da irradiação somente se tornam aparentes após um período de tempo, quando a dupla hélice do DNA não consegue desenrolar-se e o microorganismo não consegue reproduzir-se por meio de divisão nuclear.

Imagem relacionada
Fonte: Global Food
         O Clostridium botulinum é o microorganismo mais resistente à irradiação entre aqueles importantes em alimentos. Conforme em termobacteriologia, defini-se D ou D10 como a dosagem de radiciação que reduz uma população em 90%. O valor de D ou D10 do Clostridium botulinum é 4 kGy, significando a necessidade de aplicar 48 kGy para um tratamento 12 D.
         Dentre as bactérias consideradas mais sensíveis à irradiação estão incluídas a enterobactérias, especialmente as dos gêneros Escherichia, Enterobacter e Salmonella, que podem ser destruídas com a incidência radioativa abaixo de 5 kGy.
         Os fungos também possuem baixa resistência à irradiação, sendo 2 a 5 kGy suficientes para inativalos.
         Insetos e parasitas requerem doses mais baixas, entre 0,2 e 0,3 kGy.
         Os valores de  D10 em kGy, de alguns microorganismos são: Staphylococcus aureus = 0,36 a 0,45; Escherichia coli = 0,24 a 0,38; Listeria monocytogenes = 0,45; e Samonella spp = 0,38 a 0,77.
         As enzimas são bem mais resistentes às radiações ionizantes do que os esporos bacterianos. Os valores de DE (inativação de 90% da atividade enzimática) são da ordem de 50 kGy, bem alto, exigindo doses de 200 kGy para uma boa inativação de enzimas, o que afetará consideravelmente os constituintes dos alimentos. Por isso, faz-se sempre a inativação de enzimas pelo branqueamento ou pelo uso de certas substancia químicas.
         Em geral, os macronutrientes (proteínas, lipídios e carboidratos) e minerais não são afetados consideravelmente pela irradiação. Os lipídios sofrem um pouco, mais com a auto-oxidação, produzindo hidroperoxidos e resultando em sabores e odores indesejáveis.
         As vitaminas são mais sensíveis ao tratamento com irradiação em altas doses, principalmente as vitaminas E e B1.
          As alterações sensoriais dos alimentos irradiados são relacionadas com a dose aplicada e conforme o tipo de alimento, mas alguns são candidatos a alterações, como off-odor e mudanças do sabor, aroma e textura. Leite, carne, queijo, ovos e algumas frutas são mais propensos a tais alterações.

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Fonte: Blog Radiologia

Referencias Bibliográficas

   [1]-            Fellows, P. J., Tecnologia do processamento de alimentos: princípios e prática, 2 ed., Porto Alegre: Artmed, 2006.

   [2]-            Gava, Altanir Jaime, Silva, Carlos Alberto da, Frias, Jenifer R. G., Tecnologia de alimentos: princípios e aplicações, São Paulo: Nobel, 2008.




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